27.10.13

Se alguém for pequenino, venha a mim

Ó minha Madre, como são diferentes os caminhos pelos quais o Senhor conduz as almas! Na vida dos Santos encontramos muitos que nada quiseram deixar deles [2vº] para depois da morte, nem a mais pequena recordação, o mais pequeno escrito. Há outros pelo contrário, como nossa Madre Santa Teresa, que enriqueceram a Igreja com as suas sublimes revelações, não temendo manifestar os segredos do Rei, para que seja mais conhecido, mais amado pelas almas.

Qual destes dois géneros de santos agrada mais a Deus? Parece-me, minha Madre, que ambos Lhe são igualmente agradáveis, uma vez que todos seguiram a moção do Espírito Santo, e que o Senhor disse: Dizei ao justo que Tudo está bem. Sim, tudo está bem, quando não se procura senão a vontade de Jesus. É por isso que eu, pobre Florzinha, obedeço a Jesus, ao procurar agradar à minha caríssima Madre.

Bem sabeis, minha Madre, que sempre desejei ser santa. Mas, ai de mim! sempre verifiquei, ao comparar-me com os Santos, que há entre eles e eu a mesma diferença que existe entre uma montanha, cujo cume se perde nos céus, e o obscuro grão de areia pisado pelos pés dos caminhantes.

Em vez de desanimar, disse para comigo: Deus não pode inspirar desejos irrealizáveis. Posso, portanto, apesar da minha pequenez, aspirar à santidade. Fazer-me crescer a mim mesma é impossível; tenho de suportar-me tal como sou, com todas as minhas imperfeições. Mas quero procurar a maneira de ir para o Céu por um caminhito muito direito, muito curto; um caminhito completamente novo.

Estamos num século de invenções. Agora já não se tem a maçada de subir os degraus de uma [3rº] escada; em casa dos ricos o ascensor substitui-a vantajosamente. Eu queria também encontrar um ascensor que me elevasse até Jesus, porque sou demasiado pequena para subir a rude escada da perfeição. Então, procurei nos Livros Sagrados a indicação do ascensor, objecto do meu desejo, e li estas palavras saídas da boca da Sabedoria eterna: Se alguém for pequenino, venha a mim.

Então aproximei-me, adivinhando que tinha encontrado o que procurava, e querendo saber, ó meu Deus! o que faríeis ao pequenino que respondesse ao vosso apelo. Continuei as minhas buscas, e eis o que encontrei: — Como uma mãe acaricia o seu filho, assim eu vos consolarei; levar-vos-ei ao colo e embalar-vos-ei nos meus joelhos!

Ah! nunca palavras tão ternas e tão melodiosas me vieram alegrar a alma! O ascensor que me há-de elevar até ao Céu, são os vossos braços, ó Jesus! Para isso não tenho necessidade de crescer; pelo contrário, é preciso que eu permaneça pequena, e que me torne cada vez mais pequena.

Ó meu Deus! excedestes a minha esperança, e eu quero cantar as vossas misericórdias. «Instruístes-me desde a minha juventude, e até ao presente anunciei as vossas maravilhas. Continuarei a publicá-las até à minha mais avançada idade» (Sl. LXX).

Qual será para mim essa idade avançada? Acho que poderia ser já, porque aos olhos do Senhor, dois mil anos são como vinte..., como um só dia...

Ah! não penseis, caríssima Madre, que a vossa filha deseja deixar-vos... Não julgueis que ela considera maior [3vº] graça morrer na aurora do que ao declinar o dia. O que ela aprecia, o que ela unicamente deseja, é agradar a Jesus... Agora que Ele parece estar a aproximar-se dela para a atrair à morada da sua glória, a vossa filha alegra-se. Há muito tempo que compreendeu que Deus não precisa de ninguém (dela ainda menos que doutros) para fazer bem na terra.

(Teresa de Lisieux, in 'História de uma Alma', Ms C 2vº-3rº, — A grande provação interior - A noite escura da fé (1896-1897), Teresa e a Madre Maria de Gonzaga / O ascensor divino)

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