10.11.13

– «Porque dizeis isso, minha Madre?».

Uma boa Madre idosa adivinhou um dia o que eu sentia, e disse-me, a rir, no recreio: – «Minha filhinha, parece-me que não deveis ter grande coisa a dizer às vossas superioras». – «Porque dizeis isso, minha Madre?». – «Porque a vossa alma é extremamente simples; mas quando fordes perfeita, sereis ainda mais simples. Quanto mais nos aproximamos de Deus, mais nos simplificamos». A boa Madre tinha razão. No entanto, a dificuldade que tinha em abrir a minha alma, apesar de vir da minha simplicidade, era uma verdadeira provação. Reconheço-o agora, pois, sem deixar de ser simples, [71rº] exprimo os meus pensamentos com enorme facilidade.

Disse que Jesus fora «o meu Director espiritual». Quando entrei para o Carmelo, travei conhecimento com aquele que o deveria ser; mas, mal me admitiu no número das suas filhas, partiu para o exílio… Assim, só o conheci para logo me ver privada dele… Limitada a receber dele uma carta por ano, sobre 12 que lhe escrevia, o meu coração depressa se voltou para o Director dos directores, e foi Ele que me instruiu naquela ciência escondida aos sábios e aos prudentes, e que se digna revelar aos mais pequenos.

A Florzinha transplantada para a Montanha do Carmelo havia de crescer à sombra da Cruz. As lágrimas e o sangue de Jesus foram o seu orvalho, e o sol foi a sua Face adorável toldada de pranto… Até então eu não tinha sondado a profundidade dos tesouros escondidos na Santa Face. Foi através de vós, minha querida Madre, que aprendi a conhecê-los. Assim como anteriormente nos precedestes no Carmelo, também fostes a primeira a penetrar nos mistérios de amor escondidos no Rosto do nosso Esposo. Então chamastes-me, e eu compreendi… Compreendi o que era a verdadeira glória. Aquele, cujo reino não é deste mundo, mostrou-me que a verdadeira sabedoria consiste em «querer ser ignorada e tida por nada», em «pôr a sua alegria no desprezo de si mesma»… Ah! como o de Jesus, eu queria que «o meu rosto ficasse verdadeiramente escondido; que ninguém na terra me reconhecesse». Tinha sede de sofrer e de ser esquecida…

Como é misterioso o caminho pelo qual Deus sempre me conduziu! Nunca me fez desejar nada sem mo dar. Por isso, o seu cálice amargo tornou-se delicioso…

(Teresa de Lisieux, in 'História de uma Alma', Ms A 71rº, — Postulante e noviça no Carmelo (1888-1890), Primeiras provações / A Santa Face)

Sem comentários: